Futebol e Arte: Ensaio

 A paixão nacional, o esporte bretão, a pátria de chuteiras, o escrete canarinho e tantos adjetivos são utilizados no que referem o futebol e ao futebol brasileiro. O esporte das multidões tem levado ao delírio milhões e milhões de torcedores ao redor do Brasil. Desde sua entrada, popularização, consagração e sedimentação, o futebol modificou as relações tanto de torcedores como de jogadores. Nomes ficaram para história, viraram símbolo de excelência ou mesmo marca de chocolates. A característica marcante do esporte bretão, que se destaca dos outros, se faz pelo seu forte apelo social, a criação de heróis e vilões ou mesmo fatos marcantes. 

O futebol é marcado pelo fenômeno social, pois é um evento histórico em um determinado momento, em uma determinada ocasião. Sendo um fato, pode ele se embebedar pela literatura e caminhar pela ficção? 

Caso a resposta seja não, teremos que admitir que o futebol não conseguiria carregar uma mística envolvente e suficientemente prazerosa sobre o acontecimento narrado. Descartaríamos que o futebol seria cheio de dados e uma leitura mecanizada do jogo. Fulano fez uma tripleta ou hat trick, sicrano deu 200 passes certos ao longo do jogo. Estes dados seriam parte da discussão e deixaríamos de lado que o envolvimento do torcedor para com o jogo são somente os números estatísticos. Isso significa que devemos descartá-los? Evidentemente não, mas o torcedor não repete a quantidade de passes ocorridas no jogo Santos x Juventus em 1961 na Rua Javari...

Caso a resposta seja sim, teremos que admitir que o futebol consegue carregar um envolvimento social intenso e a criação de narrativas que permeiam uma história. Desde músicos que tecem lances sensacionais como em Fio Maravilha de Jorge Ben Jor ou remetem a algum jogador como Canhoteiro de Zeca Baleiro e Fagner. Também teríamos que admitir que o interesse pelo futebol faz a criação de biografias como Estrela Solitária - Um Brasileiro Chamado Garrincha de Ruy Braga ou mesmo um documentário como Pelé Eterno (2004). Mas, afinal, qual o motivo do uso da arte neste processo?

Para isso, podemos conceber que a arte não consegue agir como representação, mas como ação que é motivada pela liberdade criativa do indivíduo que a produz. O autor da arte precisa ter liberdade e tecer dentro de uma forma e conteúdo, a sua necessidade em expressar uma situação. O futebol foi essa vazão por meio da intensa produção literária (neste caso, específica do Brasil) que era distribuída em jornais de circulação à época. 

Neste caso, o futebol não tinha uma demanda literária ou artística de uma classe que consumia o futebol pelo viés editorial ou cinematográfico para dar alguns exemplos. Esse desejo foi inserido pela aceitação e o costume criado nos torcedores em ler crônicas, lances e se encantar com um olhar que reforçasse certos aspectos, valores e ações. No caso da seleção, haviam crônicas que eram escritas sem mesmo ver as partidas para reforçarem um intuito como foi dito em Nelson Rodrigues em uma entrevista. 

Formador do nacionalismo por meio da seleção nacional e a criação de heróis e vilões que foram eternizados por anos a fio em seus carreira e vidas, o futebol que foi apropriado pela classe trabalhadora, teve o seus viés eternizado pelos autores pela demanda de quem consumiam(dada a popularidade que o futebol foi atingindo ao decorrer das décadas). 

No entanto, isto não significa que o futebol e a arte não possuam problemas em sua formação. Um dos problemas apresentados é a formação e depreciação de um determinado estilo ou equipe para se forjar um jeito brasileiro sem apresentar a criação, liberdade e a modificação que o jogo passou ao decorrer do processo. Outro problema é a eternização de certas figuras como mártires que o acompanharam ao longo de toda sua história que se tornaram até mesmo sinônimos ou reforço de preconceitos como por Chico Anysio em entrevista à Revista Veja em Junho de 2006. Um último problema é o estudo de formas e conteúdos que especifiquem o futebol e a forma criativa como este é feito. Seja por meio de um feito heroico ou mesmo uma situação curiosa, o futebol tem demandas que são aspectos de sua criação e formação e que refletem o fenômeno social que o abarca e o insere. A transição entre as classes que compõe a sociedade capitalista permitem dizer que o futebol tem um forte apelo que pode levar as discussões, ações e atitudes. 

Ao fim, o futebol e a arte podem promover pela ficção, um depósito de memória que pode ser acessado e colocado por meio partidas ou situações. A encomenda para manter um certo legado, parâmetro ou mesmo permear a memória daqueles que não puderem vivenciar a ocorrência podem fazer com que o futebol perca um importante fator que move seus dilemas, a liberdade criativa apontando eventos, fatos ou mesmo situações que são contadas e relembradas pela  principal figura a que se destina o jogo e a arte, neste contexto, o torcedor.











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